Os 5,1 milhões de quilômetros quadrados que compõem a Amazônia são responsáveis pela produção de 20% do oxigênio do planeta. A área também abriga 30% das reservas de água doce potável do mundo. Apesar de sua importância para a humanidade, a região vem sendo devastada por queimadas, pela derrubada indiscriminada de árvores e pela poluição de seus rios. Mas o milionário sueco Johan Eliasch, de 44 anos, quer mudar essa situação para melhor. Eliasch está à frente de uma verdadeira cruzada para salvar a Amazônia. Seu objetivo é levantar US$ 18 bilhões, montante que ele considera suficiente para solucionar os problemas da região. “O mundo tem de pagar ao Brasil pelo serviço de proteção da floresta”, disse Eliasch à DINHEIRO. De seu quartel-general em Londres, o empresário controla a grife de material esportivo Head, cuja receita anual soma US$ 640 milhões, e busca financiadores para a causa. A primeira reunião da série de encontros que ele pretende realizar nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia até o final do ano aconteceu há duas semanas na City, o coração financeiro da capital inglesa. Falando a executivos do setor de seguros, Eliasch lembrou que as mudanças climáticas foram as responsáveis por grandes catástrofes naturais no período 2004-2005, como o furacão Katrina (nos EUA) e o tsumani (na Ásia), que custaram indenizações recordes de US$ 83 bilhões no ano passado. “Ações focadas na Amazônia podem reduzir as alterações climáticas em um razoável espaço de tempo, melhorando nossas vidas e o planeta”, defende.
O projeto de Eliasch tem como principal vertente a criação de santuários ecológicos administrados por particulares. Em 2005, ele próprio adquiriu 160 mil hectares (equivalente a quase 200 mil campos de futebol) no Estado do Amazonas, tirando de cena uma madeireira ilegal. Gastou cerca de US$ 10 milhões. A transação teve o aval da noiva, a brasileira Ana Paula Junqueira, de 35 anos, que tentou (sem sucesso) duas vezes se eleger deputada federal: em 1994 (pelo PMDB) e em 1998 (pelo PFL). Filha de fazendeiros, ela é conselheira de Eliasch para assuntos ecológicos. O empresário diz que uma parte dos US$ 18 bilhões seria drenada para programas governamentais de saúde, educação e infra-estrutura para os 20 milhões de habitantes da região.
Se Eliasch é capaz disso tudo? Provavelmente. O empresário tem uma vasta rede de contatos na Europa que reúne empresários e políticos. Na sua base, a Inglaterra, ele é um dos principais doadores do Partido Conservador, do qual integra a comissão de finanças. Freqüenta com desenvoltura a realeza britânica. No mundo dos negócios ele é tido como um financista habilidoso, que fez fortuna recuperando empresas endividadas. Foi assim com a Head. Quando assumiu o negócio, a companhia estava à beira da falência, com prejuízo de US$ 65 milhões.
Sua proposta “verde”, contudo, é vista com desconfiança por empresários e ecologistas brasileiros. “Trata-se de uma idéia simplória, incapaz de alterar a realidade local”, critica Sérgio Amoroso, dono do Grupo Orsa, que controla o Projeto Jari de papel e celulose, situado no Amapá. Amoroso também é contra o uso de recursos privados para financiar o governo. “É preciso criar mecanismos que garantam renda permanente à população.” E é isso que falta na propriedade recém-adquirida por Eliasch. Ao desbaratar a madeireira ilegal, o dono da Head “salvou a floresta”, mas acabou com a fonte de renda de mil pessoas ligadas à madeireira. Como compensação, ele permitiu que eles coletassem castanha e açaí na área. Já Roberto Klabin, herdeiro da fábrica de papel da família e dono do resort Refúgio Ecológico Caiman, situado no Pantanal, apóia Eliasch. “A Amazônia se transformou em terra de ninguém porque o governo não assume suas responsabilidades. A compra de terras já se mostrou uma opção viável no Chile e na Argentina”, avalia. Ted Turner, fundador da CNN, o investidor George Soros e o empresário italiano Luciano Benetton são alguns dos poderosos que compraram terras e as transformaram em santuários ecológicos nos dois países. São esses milionários que Eliasch quer seduzir para a sua causa.
Brasília se mantém alheia à iniciativa. Um integrante do primeiro escalão do governo federal, que pediu para não ser identificado, argumentou que o empresário ainda não procurou formalmente as autoridades. A fonte rebateu as acusações de que o governo Lula abandonou a região, citando a criação das Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), um projeto tocado pela ONG Fundo Brasileiro para a Biodiversidade e que deverá movimentar US$ 391 milhões até 2016. Os recursos virão do Banco Mundial, do Banco Alemão de Desenvolvimento e do governo brasileiro. A meta é implantar e gerir 50 milhões de hectares de reservas florestais, um território maior que a Espanha.
Para o biólogo Paulo Moutinho, coordenador do programa de mudanças climáticas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, atitudes isoladas têm pouca eficácia. Ele diz que o primordial seria a união de ecologistas, empresários e governo na luta antidesmatamento. Sua proposta é que se pague ao governo brasileiro pela redução na taxa de derrubada de árvores. Segundo Moutinho, a queda de apenas 10% no índice médio de destruição da Amazônia (que é de 20 mil km2 por ano) renderia ao País US$ 400 milhões. A conta baseia-se no mercado de créditos de carbono, pelo qual empresas e governos de nações ricas pagam aos países, que ainda têm vastas áreas verdes, compensações por emitir gases danosos na atmosfera. Como a Amazônia tem um estoque de 80 bilhões de toneladas de carbono, a “venda” desse ativo poderia render até US$ 160 bilhões.
A briga de Eliasch está só começando. Porém, antes de conquistar apoio mundo afora, ele precisará provar que é capaz de vencer uma floresta que já “devorou” figuras como Henry Ford e Daniel Ludwig, cujos empreendimentos de extração de borracha e celulose soçobraram diante da realidade amazônica.
"AMAZÔNIA É UM BOM NEGÓCIO"
Johan Eliasch, o milionário conta seus planos à DINHEIRO:
O senhor quer comprar a Amazônia?
Não. Minha intenção é investir na preservação da floresta.
Como o senhor irá levantar recursos para isso?
Vou em busca de empresários e dos governos dos países ricos, que sofrem com tragédias causadas pelas variações climáticas.
A comunidade internacional é sensível à sua proposta?
Sim. Os desastres naturais provocam prejuízos de bilhões de dólares e matam milhares de pessoas a cada ano.
Por que o senhor decidiu iniciar essa cruzada?
Acredito que é um bom negócio investir na preservação da Amazônia.
A AMAZÔNIA EM NÚMEROS
Extensão: 5,1 milhões de quilômetros quadrados
Potencial de arrecadação com crédito de carbono: US$ 160 bilhões
Prejuízo com queimadas: US$ 5 bilhões por ano (problemas de saúde e interdição de aeroportos, por exemplo)
População: 20 milhões de pessoas
Principal projeto da União: Área de Proteção da Amazônia (Arpa), que deve receber US$ 391 milhões até 2016