Comprovar o pagamento de tributos é uma maratona das mais desgastantes para as empresas brasileiras. Uma pesquisa da PricewaterhouseCoopers com 117 grupos empresariais mostra que nada menos de 92,7% dos entrevistados retardaram ou perderam negócios devido a dificuldades em conseguir a tempo a certidão negativa de débitos (CND).
A importância que a CND tem no Brasil faz as companhias empregarem muitos funcionários exclusivamente para cuidar do problema, já que se trata de um pré-requisito legal para a habilitação em licitações e concorrências públicas e para a obtenção de financiamentos e empréstimos em bancos oficiais, por exemplo. O estudo mostra que 46,3% das empresas consultadas têm entre 5 e 10 empregados dedicados exclusivamente ao cumprimento dessa tarefa, enquanto 13% têm mais de 10.
"De todas as burocracias na área tributária, a questão da CND é a pior", avalia a consultora Elidie Bifano, da PricewaterhouseCoopers. A percepção de que os obstáculos para conseguir a certidão atrapalhavam muito a vida das empresas levou a PricewaterhouseCoopers a fazer o levantamento, o que se confirmou na sondagem. "São os custos da tributação oculta", diz ela, referindo-se às ações das empresas apenas para apurar e pagar impostos, como manutenção de livros, preparo e entrega de documentos e atualização de informações.
A escolha dos grupos empresariais foi feita com base no ranking divulgado no anuário "200 Maiores", publicado pelo Valor em dezembro. Ao selecionar grandes companhias, um dos objetivos foi incluir empresas cujos motivos para não obter a CND têm muito mais a ver com questões como a falta de registro de pagamentos efetuados dentro do prazo e o retorno de dívidas já quitadas à lista de pendências, por exemplo, do que com eventual sonegação.
A consultora Luciana Aguiar diz que dificilmente a CND é obtida num prazo inferior a 30 dias e há casos em que o processo se arrasta por meses. Para encurtar os prazos, a saída de muitas companhias é recorrer à Justiça, por meio de uma liminar, conta ela. "As dificuldades para conseguir a certidão não apenas atrapalham a vida das empresas como também sobrecarregam o Judiciário", resume Elidie.
Os obstáculos para a obtenção da CND esbarram em problemas quase inacreditáveis. Um deles são os percalços causados por divergências em relação a débitos inferiores a R$ 10, uma vez que não é possível pagar um documento de arrecadação federal (Darf) cujo valor seja menor que esse. Com isso, se há uma dívida pendente abaixo de R$ 10 e a empresa decide quitá-la para acelerar a obtenção da CND, só é possível pagar no mínimo esses R$ 10. O problema então é que, "em virtude da divergência entre os valores - o que foi pago e o que consta no controle oficial -, o sistema da Receita não conseguirá efetuar o cruzamento das informações para encerramento da pendência", afirma o estudo. Das empresas consultadas, 60,4% informaram que essa diferenças irrelevantes impedem a obtenção da CND. Uma companhia perdeu um negócio por uma dívida de R$ 0,60 que estava paga, conta Luciana.
Uma boa notícia é que é possível resolver boa parte dos problemas sem mudanças na Constituição ou no Código Tributário Nacional. "Dá para melhorar a situação por meio de soluções simples, com atos administrativos da Receita", afirma Elidie. Uma delas seria definir uma "data de corte" para limitar o número de pendências. Sem isso, o que ocorre "é um processo contínuo de pendências que, quando solucionadas, já não são mais suficientes, pois novas são detectadas pelos sistemas". Luciana acha fundamental uma melhora nos controles internos da Receita, para resolver problemas apontados como os mais freqüentes no sistema informatizado do Fisco.
O tema foi selecionado pela PricewaterhouseCoopers, associada à Câmara Americana de Comércio e entidades empresariais, dentro de estudo amplo do custo da burocracia tributária.