Os próprios homeopatas afirmam que, aqui, uma explicação farmacêutica no sentido clássico não seria concebível. Ao contrário, supõem que, com a agitação, a informação da substância original é de alguma forma transferida para a água, que, com isso, ganharia suas características. Essa hipótese deixa os críticos furiosos. A Faculdade de Medicina da Universidade Marburg, na Alemanha, condena a homeopatia como "heresia e engodo do paciente".
Vários experimentos tentaram comprovar os efeitos da agitação. No entanto, nenhum resultado digno de confiança para toda a comunidade científica foi alcançado até agora. Um artigo do médico parisiense Jacques Benveniste na revista científica britânica Nature ganhou as manchetes em 1988. Ele queria provar que, numa diluição extrema, alguns soros no tubo de ensaio ainda faziam efeito. Quando, após fortes críticas, uma comissão de investigação da Nature conduziu uma série de testes, o efeito desapareceu. A carreira de Benveniste foi arruinada. Uma equipe da farmacologista Karen Nieber, da Universidade de Leipzig, ganhou um prêmio no final de 2003 por uma suposta comprovação dos efeitos da homeopatia. Ela apresentou supostas evidências de que a potência D100 do agente beladona soltava intestinos contraídos de ratos. Quando foram divulgadas irregularidades no trabalho feito, os autores devolveram o prêmio.
Outros resultados sugerem que a água não tem memória. Uma equipe do físico Thomas Elsässer, do Instituto Max-Born, em Berlim, conseguiu ativar as moléculas de uma fina película de água em determinadas vibrações e, assim, armazenar informações. Com um aparelho, os pesquisadores mediram por quanto tempo a mudança de vibração permanecia armazenada: 50 milionésimos de 1 bilionésimo de 1 segundo, no total. Ou 1 quatrilionésimo de 1 segundo. Por isso, Elsässer contesta que as informações transmitidas pela substância ainda pudessem existir em potência alta. "Nossos resultados mostram explicitamente que esse sinal molecular não existe na água. Esses fenômenos podem ser seguramente excluídos", diz ele.
Essa discussão infindável sobre potências altas levou até mesmo simpatizantes da homeopatia a tomar novos rumos. "O importante é que a terapia funcione na prática", diz o psicólogo Harald Walach, da Universidade de Northampton, na Inglaterra. Até o momento, há boas evidências. Antigamente, a maioria dos estudos de homeopatia era conduzida sob más condições. Os pacientes eram questionados apenas depois da experiência, o número de participantes era reduzido, o tempo de observação era curto e os dados eram mal documentados.
Um estudo conduzido pela equipe de Claudia Witt, do Hospital Universitário Charité, de Berlim, publicado em novembro de 2005, é considerado um divisor de águas. Os médicos pesquisaram o dia-a-dia clínico normal de mais de ä cem consultórios que trabalham com homeopatia clássica na Alemanha e na Suíça. Por mais de dois anos, acompanharam quase 4 mil pacientes. Os homeopatas obtiveram uma nítida melhora na maioria dos participantes. Em um exame paralelo com 493 desses pacientes, os pesquisadores descobriram até uma vantagem terapêutica da homeopatia em relação ao tratamento convencional.
Um novo pragmatismo começa, portanto, a ganhar força. Tudo o que ajuda, dizem os partidários desse pragmatismo, pode contribuir na cura. No Hospital Hofheim, perto de Frankfurt, na Alemanha, o estudante de Psiquiatria Ulrich Koch prescreve glóbulos contra depressão e esquizofrenia. Mas afirma: "Não sou de forma alguma dogmático. Metade de meus pacientes recebe também psicotrópicos". No Hospital Pediátrico Haunerschen, da Universidade de Munique, quem faz tratamento de câncer recebe bolinhas homeopáticas junto com a quimioterapia. No Brasil, médicos do Hospital das Clínicas de São Paulo receitam homeopatia para algumas doenças crônicas, como alergias e bronquite. "A gente alterna alopatia com homeopatia, conforme o caso. É uma questão de bom senso", diz Marcus Zulian Teixeira, clínico geral do HC.
Em 1995, quando a pediatra e homeopata Sigrid Kruse entrou no hospital de Munique, com financiamento da Fundação Carstens, que costuma destinar recursos a pesquisas de medicina alternativa, encontrou ceticismo. Quando a verba acabou, pais juntaram dinheiro para mantê-la no cargo. A história mais impressionante é de Lukas, bebê diagnosticado com leucemia aguda e prognóstico ruim. Durante a quimioterapia, sofreu com vômitos e inflamações da mucosa oral. Os pais quiseram um acompanhamento homeopático para aliviar os efeitos da quimioterapia. Depois de oito dias, a medula já produzia novas células. Lukas está hoje saudável e vai ao jardim-de-infância. "Uma experiência bonita", diz Kruse.
São evidências esparsas. A medicina tradicional só determina que um remédio funciona depois de uma série de testes mais rigorosos. Nesses estudos, uma parte dos pacientes pesquisados recebe um remédio falso, chamado placebo. Nem o paciente nem os cientistas sabem quem recebe esses placebos. Isso é chamado teste duplo-cego. Um estudo atual do pediatra Heiner Frei, da Universidade de Berna, na Suíça, é considerado metodicamente rigoroso. Ele encontrou efeito no tratamento homeopático de um grupo de 62 crianças hiperativas. Com o estudo, Frei desmentiu a opinião de muitos homeopatas de que seus princípios individuais de tratamento não poderiam ser comprovados por um estudo duplo-cego-padrão. A solução de Frei: antes do exame, deixou que as crianças fossem diagnosticadas e que os medicamentos individuais fossem determinados. Só então elas foram divididas em dois grupos. Agora, os resultados precisam ser comprovados por estudos aprofundados feitos por outros pesquisadores.
O fim da homeopatia já foi anunciado até pela renomada revista científica britânica The Lancet, em agosto de 2005, na ocasião da publicação da avaliação supostamente definitiva de vários estudos anteriores. Esses estudos, que consolidam pesquisas anteriores, são chamados meta-análises. Uma equipe de pesquisa do epidemiologista Matthias Egger, da Universidade de Berna, na Suíça, avaliou, com os mais modernos métodos estatísticos, todos os estudos homeopáticos controlados disponíveis. Também chegou à conclusão de que nenhum resultado de cura superior ao de um placebo pôde ser comprovado.
Tal comentário parece um pouco drástico, pois o médico estatístico de Berna considerou apenas oito de 110 estudos avaliados como bons o suficiente para ser incluídos na meta-análise. Vários desses estudos misturavam o uso da homeopatia para várias indicações clínicas, de dor muscular a câncer. "Tirar desses resultados conclusões tão extensas é totalmente inadequado", afirma Klaus Linde, do Centro de Pesquisa Naturopática, da Universidade Técnica de Munique. Klaus é um dos poucos especialistas que se movimentam entre os dois campos da medicina.
Em 1997, Linde causou furor com outra meta-análise, também publicada na revista The Lancet, ao concluir que não era possível atribuir os efeitos da homeopatia totalmente ao placebo. Hoje ele diz: "Estou confuso". É verdade que ele duvida cada vez mais dos efeitos dos glóbulos, mas essas histórias ainda o impressionam. "Durante vários meses, você vai ao homeopata, e nada muda. Então, ele troca o remédio e algo drástico acontece. Como explicar?", pergunta Linde.
Existe uma explicação alternativa possível para o sucesso da homeopatia. Mas ela costuma incomodar os homeopatas clássicos. Essa explicação sustenta que a cura não seria tanto efeito dos glóbulos, mas das orientações sobre estilo de vida que o homeopata dá durante as longas consultas, da relação de confiança entre médico e paciente e da crença no medicamento. Até o estatístico Rainer Lüdtke, da Fundação Carstens, chega a uma conclusão parecida em um relatório de uma pesquisa ainda não publicada: "O conceito básico da pesquisa homeopática, que associa a eficácia geral da homeopatia à eficiência isolada dos medicamentos, precisa ser visto como fracassado em sua totalidade".
LIMITES MÉDICOS
Farmácia de homeopatia na França
Tal conclusão não significa o fim da homeopatia. "Em vez de falar em efeito placebo, ä poderíamos dizer que houve um estímulo das forças curativas do próprio organismo", afirma Linde. Pois um efeito placebo não significa cura imaginária, mas uma melhora eficaz e mensurável, graças ao apoio cordial da mente. Se um paciente de Parkinson acredita na terapia, ele mesmo libera mais dopamina, substância que reduz os sintomas da doença. Em muitos casos, a simples expectativa positiva do paciente pode reduzir a sensação de dor. Médicos do Instituto Pasteur, na França, fizeram uma experiência polêmica para avaliar os efeitos da auto-sugestão. Colocaram pessoas com mal de Parkinson em salas cirúrgicas e simularam uma operação no cérebro. Os pacientes tiveram melhoras significativas. Estudos do tipo duplo-cego mostram que o efeito placebo funciona também em crianças e cachorros.
A medicina do futuro não deveria descartar os efeitos de cura do próprio organismo, mas refletir sobre como aproveitá-los melhor, afirma Linde. É verdade que sua eficácia ainda é pouco compreendida, mas aumentam os indícios de que não se trata simplesmente do efeito sempre forte de qualquer terapia. Mesmo que seja apenas placebo, a acupuntura faz mais efeito que as pílulas falsas de açúcar, por exemplo. É possível que os homeopatas tenham, ao longo dos séculos, entendido melhor, intuitivamente, como estimular as forças curativas do organismo humano. Com isso, a medicina tradicional teria algo a aprender. Pois o velho ditado ainda é válido: quem cura tem razão.
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