Revista O Empresário / Número 157 · Agosto de 2011
Senhor, Tu sabes que estou envelhecendo, ajuda-me a pensar que não sou uma peça imprestável no movimento da vida. Reconheço que não tenho mais as mesmas capacidades físicas que me animaram na juventude, nem os mesmos reflexos e disposição. Contudo, auxilia-me a não me desanimar e, muito menos, pedir aposentadoria indevida das lides do mundo.
Não me deixes murchar como flor queimada pelo sol. Não permita que eu tenha a ideia fixa de falar de mim o tempo todo. Impede-me de repetir detalhes infindáveis. Dá-me rapidez, para que eu seja objetivo. Fecha a minha boca quando eu estiver propenso a falar de minhas dores e de meus sofrimentos; eles estão aumentando com o passar dos anos e meu desejo de falar deles aumenta a cada dia.
Ensina-me a dialogar, sem me fazer excessivamamente falador, a fim de não causar indisposição nos demais. Não me permitas conceber limitações desnecessárias. Coloca as minhas mãos no trabalho, a fim de que eu elabore ainda, criações no campo da música, da pintura, da jardinagem, da cerâmica. Ensina-me a melhor ocupação para o tempo de que disponho. Um tempo que, desde os dias da juventude, reclamava não ter. Permita que eu me levante a cada dia disposto a aprender alguma coisa mais - pode ser uma forma diferente de usar o pincel, uma breve poesia, um ensinamento, uma receita surpreendente. Desejo ser jovial sem parecer tolo e imprudente. Torna-me solícito, mas não abelhudo; prestativo, mas não dominador.
Desejo ser um avô que possa contribuir com a educação dos meus netos e não os deseducar, com a única finalidade de que apreciem sair comigo nas tardes de primavera.
Ensina-me ainda a gloriosa lição de que algumas vezes posso estar errado. Aprendi muito, guardo experiências preciosas, mas não tenho o direito de desprezar os avanços da modernidade e da ciência. Depois de ter adquirido uma enorme bagagem de sabedoria e experiência, parece uma pena eu não poder usá-la totalmente, sem criar embarços aos demais. Se a dependência física se tornar necessária, ajuda-me, Deus, a ter paciência comigo mesmo, suportando o corpo que tanto me serviu até aquí. Com ele, dancei, cantei, vivi doçuras, momentos bons e maus. Auxilia-me a continuar a amá-lo.
Tu sabes, Senhor, que precisarei não ser inconveniente, a fim de não incomodar os demais. Por isso, Te peço que me ensines a pensar duas vezes antes de reclamar, insistir e exigir o que quer que seja, a quem tenha que cuidar de mim. Se eu tiver que experimentar a viuvez, dá-me a Tua mão quando a da minha esposa já não estiver por perto; afinal, Senhor, foram tantos anos que despertei ao toque suave do carinho dela.
Não me permitas secar a fonte das lágrimas, precisarei delas nas horas de tristeza, para desafogar o coração cansado. Entretanto, não deixes que eu me torne um ser melancólico e chorão. Permita-me gozar do calor do sol e da bênção da chuva, com o mesmo entusiasmo de sempre.
E, Senhor, o meu desejo final é ter sempre alguns amigos. Esses seres abençoados que no mar imenso da vida, qual jangada preciosa, remaram firmemente ao meu lado. Muitos deles poderão partir antes de mim, mas permite que alguns permaneçam, a fim de que nunca desapareça de vista a expectativa das suas presenças.
Enfim, Senhor, torna-me um ancião nobre, que demonstre a sabedoria do envelhecimento digno. (redação do Momento Espírita)