O governo federal vai tentar escapar de uma derrota no Supremo Tribunal Federal (STF) na disputa que discute a exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins alterando a Constituição Federal. A incidência de um tributo sobre outro, até hoje sem previsão constitucional, mas de uso generalizado no sistema tributário brasileiro, ganhou dispositivos exclusivos no projeto de reforma tributária - a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 233, de 2008. O texto é uma forma de contornar os possíveis prejuízos bilionários de uma derrota da União no Supremo, onde o julgamento está suspenso, mas com maioria de seis votos a um a favor dos contribuintes.
A inclusão do tema na reforma tributária tem gerado indignação entre advogados não só por ser uma mudança das regras no meio da disputa, mas porque a incidência de tributo, dizem, vai contra princípios básicos do direito tributário. Introduzida em dois pontos da PEC, a autorização para a incidência de tributo resolveria, para o governo, não só o problema do ICMS na base de cálculo da Cofins, mas de todas as disputas paralelas sobre o mesmo tema - como a inclusão do ISS na base de cálculo da Cofins, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) da base do Imposto de Renda e também a incidência do ICMS sobre o próprio ICMS, a chamada fórmula da incidência “por dentro” do imposto.
A previsão da dupla incidência está dentro do artigo que cria o Imposto sobre Valor Agregado Federal (IVA-F), que sucederá Cofins, PIS,IPI e Cide, e no artigo que trata do Imposto sobre Valor Agregado Estadual (IVA-E), que sucederá o ICMS.
A PEC é vista como um instrumento de convencimento poderoso nas mãos da União. A mera apresentação do projeto indica ao Judiciário que agora não é o momento apropriado para se mexer na disputa. Uma vez promulgada a alteração na Constituição, uma decisão do Supremo teria vida curta e provocaria tumulto na Justiça. O julgamento sobre o tema foi iniciado no Supremo há um ano e oito meses e enfrenta dificuldades para ser retomado no pleno da corte desde que foi novamente liberado para ir à apreciação, em fevereiro. No caso de a PEC ser realmente aprovada neste ano, como quer o governo, mesmo que o Supremo encerre rapidamente a disputa, a nova jurisprudência sobreviveria apenas até o fim de 2009.
O tributarista Luiz Gustavo Bichara diz qua a aprovação do texto da reforma será um retrocesso, pois a discussão sobre a incidência de tributo sobre tributo já é um tema superado em quase todos os países desenvolvidos - nos Estados Unidos, diz, o tema foi decidido há mais de 40 anos. Para ele, a proposta do governo pode ter um efeito inverso, pois com o projeto o fisco admite que não há autorização constitucional para a forma como é cobrada a Cofins.