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Revista O Empresário / Número 110 · Julho de 2007



Turista! Pressupõe-se que todo ser humano quando assume esse papel esteja predisposto a gastar um pouquinho mais.

Turista não pensa muito para externar sua alegria na praia, no campo, em restaurantes, principalmente para comprar as até “simples, mas de coração”, lembranças para os entes mais queridos. Um chaveirinho, uma camiseta, um porta copos. Vale tudo para marcar a recordação da pessoa, mas com uma condição: o nome do lugar deve estar em exposição e, geralmente, acompanhado de alguma imagem, algum desenho, que possa ser associado às características, paisagens e tradições do local.

Nessa atmosfera, eu estava em Veneza, Itália, “turistando” como nunca, quando me deparei com uma bela loja de calçados, uma vitrine deslumbrante e letreiros dourados. Em letras clássicas, garrafais, eu li: “Casella”.

Confesso ter sido tomado por emoção. Meu sobrenome estampado em um lugar maravilhoso daqueles, em plena Piazza de San Marco. Lembrei-me momentaneamente das histórias contadas pelo meu avô, da humilde trajetória e sobrevivência no sul do país da bota. Não resisti e entrei na loja, com meu passaporte brasileiro em mãos (com muito orgulho, sim senhor!), meu RG e aquele tradicional jeitão de turista disposto a consumir. Buscava não tirar nenhuma vantagem do estabelecimento, mas criar uma identidade, uma sintonia e, quem sabe, até achar um parentesco com o fundador, dono ou qualquer informação que permitisse sentir-me acolhido e valorizado. Pensando bem, tempos depois, estava tentando realizar um exercício de “rapport” com o estabelecimento e tinha uma ferramenta maravilhosa para isso.

Bom, o fato é que fui recebido com a maior frieza européia pelo vendedor e encaminhado a um senhor atrás do balcão. “Sim, esse poderá me valorizar.” Que nada! Manteve a mesma frieza, adicionada de indiferença, limitando-se a dizer que se tratava de um nome muito comum na Itália. Confesso que sai constrangido do local, indignado com a forma como fui tratado. “Caro Casella, pode ser comum para o senhor, mas para mim é uma experiência única”, pronunciei antes de sair.

Analisando comercialmente a situação, sob a ótica de técnicas de varejo, quantos benefícios o estabelecimento poderia ter tirado dessa situação? A barreira emocional já estava conquistada e a sintonia pronta. Era uma questão de sorrir, ouvir, colocar o cliente (eu!) no controle da situação, apresentar produtos e enfatizar questões familiares e de raízes.

Eu poderia ter trazido para minha família, no Brasil, produtos embalados, etiquetados, em sacolas com a marca Casella, pois seria inesquecível para todos. Seria, se o vendedor italiano e, principalmente, o gerente, dono ou coisa que o valha, tivesse tido outra atitude.

Privilégio de italianos? De jeito nenhum. Em nosso continente, bem aqui, no país da “operação navalha”, comento, em minhas palestras, o atendimento que recebi em um posto de gasolina em que era freqüentador assíduo. O frentista, “Seu João”, grande figura, só faltava estender o tapete vermelho para que eu descesse do carro e ele fizesse todo o checkup de pneus, água, óleo e combustível. Sensacional.

Para minha infelicidade (e agora deles também), tinha de me dirigir à loja de conveniências, “saltando” produtos expostos e profissionalmente ofertados pelo “Seu João”, para passar meu cartão. O fato é que, por duas oportunidades, repito: duas vezes, a atendente me recebeu de maneira absolutamente áspera, sem sorrir (É verdade, não consegui ver sequer um dentinho da criatura), sem a menor paciência, manejando o cartão na máquina como se estivesse tirando as vísceras de um peixe para consumo imediato.

Para minha nova infelicidade (repito: e deles também), nas duas vezes houve um problema de leitura magnética. E pude ver a satisfação da moça, ao devolver meu cartão com a simples frase: “Não está passando.” Imediatamente, seus dedos e unhas passaram a marchar compulsivamente sobre o balcão, em um gesto mix de impaciência e prazer pela negação.

Hoje, passo pelo posto, aceno para o “Seu João” que, com um olhar triste, responde timidamente, convicto de que todo seu trabalho, zelo e profissionalismo, não foram correspondidos na simples cadeia de atendimento composta por duas pessoas. Tenho o cuidado de ver se a moça está lá e ando mais sete quilômetros até o posto seguinte. Quando ela não estiver mais, eu paro. Por enquanto, engordo a massa de clientes que não volta mais.

Parece que eu já vi essa história em outros lugares. E você?


Fonte-Dill Casella
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