O que é realmente importante para você?
Hoje, seguindo minha rotina, acordei atrasado pensando que de novo só 24 horas talvez não sejam suficientes. Fingi que tomei um café e também que esse café me despertou. Escovei os dentes quase ao mesmo tempo em que botava a meia direita e o sapato esquerdo. Saí tropeçando em familiares indiferentes ao meu foco de atravessar a sala e bati a porta atrás de mim deixando um eco silencioso de que esquecia alguma coisa. Eram apenas as minhas chaves e não relações ou cuidados pessoais, como alguns poderiam supor.
O trânsito me irrita como um velho companheiro em um asilo, até porque o tempo que passo com ele parece se transformar em anos, séculos, uma eternidade. Pela pressa que tenho em chegar, as vezes parece que o escritório é um lugar onde eu realmente deveria estar. Pessoas desconhecidas vão se apresentando em forma de emails, reuniões, telefonemas, ‘‘bons dias’’ ignorados. Só um pouco mais de café… Basicamente disso é feita minha manhã.
O almoço é rodeado de pessoas sobre as quais não sei nada, além do número do ramal anotado ao lado do meu telefone. Meu chefe é um idiota, o garoto novo é um puxa saco, a secretária é uma víbora. Eu, por minha vez, me sinto cada vez mais acomodado nesse padrão. Já que o salário não atrasa, trabalhar no lugar errado parece o mais certo a fazer.
A volta pra casa é recheada de pensamentos sobre tarefas que já deveriam estar concluídas. Prazos, contas, prestações, desânimo, frustração e envelhecimento. Finalmente chego e posso descontar na maçaneta emperrada aquele sapo que engoli no final da tarde ou no cachorro carente que late demais a promoção que não recebi.
No espelho sujo do banheiro me deparo comigo mesmo e com as olheiras que não havia percebido que tinha. Nem me dou conta de que sinto inveja da pessoa que não consegui me tornar. Talvez, e um talvez bem distante da minha inóspita realidade já aceita, eu esteja pegando pesado demais.
Quem sabe eu esteja sendo atropelado pelo meu trabalho, pela minha rotina e por minhas escolhas que cada dia parecem mais erradas, exaustivas e muito persuasivas. Bochecho o enxaguante bucal e cuspo na pia as reflexões sobre mudanças que ainda não são prioridades.
Tento ignorar o volume da TV do cara na porta ao lado, enquanto cronometro os minutos que ainda tenho até que a madrugada se torne outra manhã apressada. Antes de fechar os olhos prometo que, assim que sobrar tempo, vou pensar melhor sobre mim mesmo. Qualquer dia desses, mas não amanhã.
Por: Viva Mais notícias da mídia Notícias pesquisadas em jornais e sites.