Em 2020 (daqui a oito anos), um avô e seu neto têm o seguinte papo:
- Vovô, por que o mundo está acabando?
A calma da pergunta revela a inocência do garoto e no mesmo tom, vem a resposta:
- Porque não existem mais professores, meu anjo.
- Professores? O que é isso? O que faziam os professores?
- Professores eram homens e mulheres elegantes e dedicados, que se expressavam sempre de maneira muito culta e que transmitiam conhecimento e ensinavam as pessoas a ler, falar, escrever, se comportar, localizar-se no mundo e na história, entre muitas outras coisas. Principalmente, ensinavam as pessoas a pensar.
- Eles ensinavam tudo isso? Eram sábios?
- Sim, ensinavam, mas não eram todos sábios. Apenas alguns, os grandes professores, que ensinavam outros professores e eram amados pelos alunos.
- E como foi que eles desapareceram, vovô?
- Ah, foi tudo parte de um plano secreto e genial, que foi executado aos poucos por alguns vilões da sociedade.
O vovô não se lembra direito do que veio primeiro, mas sem dúvida, os políticos ajudaram muito. Eles acabaram com todas as formas de avaliação dos alunos, apenas para mostrarem estatísticas de aprovação. Assim, sabendo ou não alguma coisa, os alunos eram aprovados. Isso liquidou o estímulo para o estudo e apenas os alunos mais interessados conseguiam aprender alguma coisa.
Depois, muitas famílias estimularam a falta de respeito pelos professores, que passaram a ser vistos como empregados de seus filhos. Estes foram ensinados a dizer “eu estou pagando e você tem que me ensinar” ou “para que estudar, se meu pai não estudou e ganha muito mais do que você” ou ainda “meu pai me dá mais de mesada do que você ganha”. Isso, quando não iam os próprios pais gritar com os professores nas escolas. Para isso, muito ajudou a multiplicação de escolas particulares, as quais, mais interessadas nas mensalidades que na qualidade do ensino, quando recebiam reclamações dos pais, pressionavam os professores, dizendo que eles não estavam conseguindo “gerenciar a relação com o aluno”. Os professores eram vítimas da violência – física, verbal e moral – que lhes era destinada por pobres e ricos. Viraram saco de pancadas de todo mundo. Além disso, qualquer proposta de ensino sério e inovador sempre esbarrava na obsessão dos pais com a aprovação do filho no vestibular, para qualquer faculdade que fosse. “Ah, eu quero saber se isso que vocês estão ensinando vai fazer meu filho passar no vestibular”, diziam os pais nas reuniões com as escolas. E assim, praticamente todo o ensino foi orientado para os alunos passarem no vestibular. Lá se foi toda a aprendizagem de conceitos, as discussões de ideias, tudo, enfim, virou decoração de fórmulas. Com a Internet, os trabalhos escolares e as fórmulas ficaram acessíveis a todos e nunca mais ninguém precisou ir à escola para estudar a sério.
Em seguida, os professores foram desmoralizados. Seus salários foram gradativamente sendo esquecidos e ninguém mais queria se dedicar à profissão.
Quando alguém criticava a qualidade do ensino, sempre vinha algum tonto dizer que a culpa era do professor.
As pessoas também se tornaram descrentes da educação, pois viam que os “bem sucedidos” eram financiadas por políticos e empresários: modelos, jogadores de futebol, pagodeiros, agiotas, traficantes, artistas de novelas da televisão – enfim, pessoas sem nenhuma formação ou contribuição real para a sociedade.