Revista O Empresário / Número 173 · Dezembro de 2012
Hipocondríaco, mas um pouco relapso. Estressado e com doenças associadas ao estilo de vida moderno. Esse foi o principal diagnóstico observado na pesquisa feita pela empresa ePharma, sobre o perfil de consumo de medicamentos por executivos e funcionários de grandes corporações do país.
O universo pesquisado foi de 220 mil pessoas dos quase 1 milhão de vidas do mundo corporativo atendido pela ePharma. O comportamento não foge muito à regra geral da população brasileira, no qual a automedicação para combater uma simples dor de cabeça, por exemplo, faz parte da cultura do país, e a crescente substituição de medicamentos de referência por genéricos reforça uma tendência global de mercado.
O que mais surpreende nessa pesquisa é o consumo inadequado de alguns importantes medicamentos cuja prescrição médica é obrigatória, casos do Rivotril (antidepressivo), Viagra (combate à disfunção erétil), e de antibióticos. Além disso, os dados compilados pela ePharma mostram o alto índice de desistência, sobretudo por parte dos homens, em dar prosseguimento a importantes tratamentos médicos. O alto consumo de Rivotril, o oitavo item dos medicamentos mais comprados com receita obrigatória (em 2010 era o primeiro e em 2009 era o nono), é considerado um dos mais emblemáticos na pesquisa. A droga, desenvolvida pela farmacêutica suíça Roche, nos anos 70, para tratar de convulsões, está entre os dez principais remédios de prescrição consumidos por esse perfil de usuários nos últimos três anos. O curioso é que nos últimos 30 anos uma nova classe de produtos dessa linha de tratamento foi lançada, mas esse produto continua entre os mais prescritos.
“O Rivotril é um dos remédios mais vendidos no Brasil, muito mais que analgésicos e antibióticos”, afirmou o médico Marcelo Feijó de Mello, professor adjunto do Departamento de Psiquiatria da Unifesp. O uso desse medicamento, segundo levantamento da ePharma, é feito na maioria das vezes por mulheres da faixa etária 4 (de 40 a 49 anos). Esse remédio é coadjuvante em tratamento de um médico especialista, mas como o Rivotril tem efeito imediato e baixa a ansiedade, é receitado por uma classe médica, que não é a especializada, como ginecologistas e clínicos gerais, por exemplo.
Outro fator curioso é o uso de Viagra e seus genéricos por homens entre 30 e 39 anos. O remédio não está entre os dez mais vendidos, mas faz barulho. O consumo desse produto deveria ser feito por pessoas acima de 60 anos. Segundo Sidney Glina, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia, há três grupos que consomem medicamentos de combate à disfunção erétil: os que realmente precisam, os que buscam turbinar a relação sexual, geralmente na faixa dos 30 anos, e os que são inseguros. “Esse último grupo está na faixa dos 18 anos a 20 anos, que tem medo de não conseguir ter um bom desempenho.” Segundo ele, o problema de tomar esse remédio sem precisar é o risco psicológico. Na lista dos dez medicamentos com receita obrigatória os antibióticos genéricos reinam. O consumo pode criar resistência a antibióticos, observou Múcio de Oliveira, diretor da unidade de emergência do Incor. “Conforme vai criando resistência, o paciente vai ter que tomar drogas mais potentes.” O mesmo vale para comprar uma peça para carro sem consultar o mecânico.”
O alto índice de descontinuidade de tratamento observado pela pesquisa também é preocupante. Cerca de 30% dos que desistem, têm doenças consideradas graves. Os homens são os que mais tendem a abandonar o tratamento. Essa postura relapsa tem explicação: “Faz parte da cultura feminina se tratar, do homem não. Depois acham que não precisam se cuidar. Procurar ajuda médica na linguagem masculina é visto como fraqueza. Ele não quer ter nada, então abandona.
Após os 40 anos, voltam para fazer acompanhamento de próstata e hipertensão. As terapias hormonais e de distúrbios emocionais são as de mais demandas por esse grupo de usuários do mundo corporativo, nas quais predominam o público feminino, seguidas pelas de cardiopatias e anti-hipertensivas.
Cerca de 15% da população têm algum problema cardiovascular e hipertensivo. E no caso da hipertensão a causa nunca é uma só. Além da predisposição genética, a doença está associada à alimentação rica em sódio, obesidade, ambiente estressante, sedentarismo e diabetes. No ranking dos remédios isentos de receita, os analgésicos genéricos para aliviar dores lideram, o que indica um comportamento de automedicação. Os de prescrição médica também são, na maioria, genéricos.