Viver permanentemente no cheque especial e no cartão pode indicar um problema: é a ilusão da vida baseada no crédito. “Isso tem criado ilusão de posse, de renda, na vida das pessoas que passam a consumir como se fossem muito mais ricas que efetivamente são”, diz a psicanalista Márcia Tolotti.
Ela é frequentemente contratada por empresas para ações de educação financeira que tentam acabar com o que ela chama de “vício de crédito”. “A partir do momento em que o crédito vira uma condição quase normal para viver, surge o problema. Do ponto de vista racional, todos sabem que isso não deveria acontecer. Mas a necessidade de posse fala mais alto e as pessoas passam a agir para ter o que não podem e o cheque especial e o cartão são os caminhos mais fáceis”, diz.
Empresas têm contratado pessoas como Márcia, porque o fenômeno começa a prejudicar a produtividade de algumas companhias. Normalmente, o comportamento que chama atenção dos empregados começa com o funcionário que toma empréstimo com desconto em folha, o crédito consignado. Várias semanas depois, ele aparece no departamento de recursos humanos e pergunta se é possível pegar um vale ou antecipar o pagamento das férias. Algum tempo depois, o destino muda para o ambulatório, onde ele declara problemas de saúde, como a depressão. “A empresa também passa a sofrer com a baixa produtividade”.
Márcia diz que a “urgência da satisfação” é, aparentemente, o fator que mais deflagra o uso exagerado do crédito nos brasileiros. “É a desculpa do ‘eu mereço’ e preciso me satisfazer agora. A ciência já mostrou que quando as pessoas compram é liberada dopamina no corpo, que é uma substância muito prazerosa e viciante”, diz. “Mas as pessoas precisam ter estrutura para entender que essa alegria gerada pela compra é momentânea e não existe vida bem estar supremo e constante”.